sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

A verdadeira verdade

Admito as minhas dúvidas sobre a introdução das novas tecnologias no futebol. Da mesma forma que confesso que o estado das “coisas” tenderia a melhorar com a diminuição da margem de erro nos lances que marcam uma partida ou com o desmascarar dos jogadores que falseiam os próprios lances do jogo onde intervêm.
Não tenho dúvidas que grande parte das estrelas de hoje – e estou a falar do futebol português – poderiam não ser tão consagradas se os lances que “escavam” com ferramentas do vício e da mentira fossem desmentidos por imagens sujeitas a verificação por árbitros durante os jogos.
Por outro lado, e atendendo ao cenário do que se vem verificando, onde os mesmos lances são escalpelizados por alegados e propalados especialistas, tenho dúvidas se o decorrer dos jogos não seria prejudicado por decisões demoradas e, ainda assim, de dúbia análise.
Façamos um intervalo naquilo que não me convence. E passemos à campanha “Pela Verdade Desportiva”, que tem ganho espaço nos noticiários, mas que mais não é que um golpe de comunicação para engrandecer uma personalidade e que serve os interesses de muitos que a falseiam no seu quotidiano desportivo. Sublinho, a propósito, que não ponho em causa o valor ou a competência de Rui Santos enquanto jornalista ou comentador, mas sim os meios que tem usado para atingir o seu fim.
Na semana passada, vi jogadores do Benfica e do Sporting na comitiva “oficial” que se deslocou à Assembleia da República, em romaria pela “Verdade Desportiva”. Digo eu, que até tenho uma noçãozita de História de Portugal, que todos deveriam ter imitado Egas Moniz e levado ao pescoço o nó da forca. Sim, porque não vi lá nenhum que tivesse um currículo imaculado no que diz respeito à tentativa de iludir os árbitros, de falsear lances na grande área ou de reconhecido valor em termos de fair-play. O que vi foram excelentes praticantes da modalidade que em vez de fazerem mea culpa, o que mais serviria os interesses do futebol nacional, apareceram estilo virgens ofendidas na própria honra.
Apeteceu-me que o político de serviço (embora o politicamente correcto impedi-lo-ia, por uma questão de fair-play à portuguesa) lhes tivesse gritado: que atire a primeira pedra quem nunca se mandou “para a piscina” num campo de futebol…
“Verdade Desportiva” sim. Novas tecnologias no futebol, também sim. Mas se no primeiro caso é preciso ter outra gente que credibilize o movimento (Rui Santos aceita tudo o que é bicho careta, desde que seja conhecido no meio), já no segundo é preciso ter gente que garanta a real verdade desportiva.
Mais depressa se resolveria a verdade desportiva em Portugal se a UEFA aceitasse a simples ideia de criar uma bolsa de árbitros, com juízes internacionais, de todos os países, e tornasse possível que um francês apitasse um Benfica-FC Porto ou um alemão dirigisse um AC Milan-Inter…
Penso que a melhor prova é sentir-se verdade desportiva numa Champions League. E alguns clubes portugueses (poucos, nos últimos anos) experimentam-na e sabem conviver com ela. O problema é que outros acham que a verdade desportiva é apenas mais uma ferramenta para os ajudar a vencer… Estão errados. A verdade desportiva é apenas o cumprimento das regras. E isso, nenhum emblema pode reclamar para si, em exclusivo. Isso é falsear!

Texto redigido ao som de "Loverman" - Nick Cave, 1994

"Loverman, o rapaz adorável... Quando o homem quer ser visto como puro e isento enquanto o seu próprio esforço se perde nos meios e fantasias que o acompanham."

António
Jornalista




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